A garota mantinha-se quieta e pensativa, ao contrário da maioria de seus colegas de escola. Barulhentos e agitados, estes irritavam-na, de forma que assim que embarcou buscou uma cabine um pouco mais vazia. E com um pouco mais vazia, entenda-se que havia apenas um aluno dentro dela, o que Annelise julgou uma sorte imensa.

O garoto parecia estar nos seus últimos anos em Hogwarts, a julgar por aparente idade, mas decidiu não se intimidar; murmurou um quase inaudível cumprimento e sentou-se numa poltrona de frente para este. Ele não respondeu, e isso fez com que ela tentasse descobrir o por quê, e logo descobriu. Sobre seu colo estava um livrinho preto, e por não conseguir enxergar um título na capa, sua curiosidade aguçou-se. Ele deveria ser dos veteranos, que tipo de magia estaria estudando? E o mais intrigante, por quê ele não tirava os óculos escuros para ler?

Apesar de sua curiosidade, preferiu deixar-lhe em paz. Pessoas quando leem gostam de tranquilidade, falava por experiência própria. Portanto, apenas conferiu o cabelo na janela do vagão, ajeitou o vestido simples nas cores da sua casa e pôs a bolsa de ombro sobre o colo, entreabrindo-a para conferir se uma certa amiguinha estava bem, mas fechou-a rapidamente, lembrando-se do rapaz a sua frente. Kinsky esteve durante muito pouco tempo na escola no ano passado por causa do incidente com seus pais, de forma que não era de se admirar que não reconhecesse um dos monitores chefes da instituição.

Não percebera quando, mas o balanço do trem e a falta do que fazer acabaram por fazer a pequena alemã adormecer. Apenas se deu conta de que provavelmente era tempo de deixar o expresso quando o apito da locomotiva a fez despertar no susto, o que quase fez com que a bolsa em seu colo que continha Coraline despencasse no chão.O garoto já havia ido embora.

"Hey! O que pensa que está fazendo, Kinsky? Tenha mais cuidado!" - pôde ouvir imediatamente quando abriu a bolsa para conferir o estado da amiga.

- Desculpe, Coraline, foi o susto. - respondeu a menina, sem-graça pelo ocorrido. - Pelo lado bom da coisa, estamos quase lá. Tenho certeza que você vai gostar da comunal da Sonserina.

Após se desculpar, Annelise ignorou alguns outros resmungos da cobrinha enquanto procurava por seu uniforme e foi vesti-lo num dos banheiros. Quando voltou para terminar de recolher o que era seu, notou que no lugar onde o rapaz que lhe acompanhava - e que poderia ter muito bem lhe acordado, pensou - estava o misterioso livrinho preto.

A garota foi até a porta do vagão e olhou no corredor algumas vezes para checar se avistava-o, e como não pôde captar nenhum sinal dele, resolveu pegar o objeto para devolver-lhe na escola. Por maior que fosse sua ética, ela também não pôde resistir a dar uma espiadinha por suas páginas, afinal, que tipo de magia aquilo poderia conter? Para o seu desapontamento, o livro era todo escrito em caracteres pra lá de estranhos, isso fez um biquinho tomar-lhe os lábios.

Ainda assim, decidiu que tentaria descobrir o que significariam aquelas inscrições antes de devolvê-lo para o moço dos óculos. Então arranjou um espaço para ele em sua bolsa afastando gentilmente Coraline - ainda que a mesma protestasse.