Tinha acabado de vir do ninho. Cartas eram um meio de comunicação que caiu em desuso, principalmente com celulares e a facilidade em trocar mensagens e afins, contudo meu pai ainda era das antigas e decidiu enviar-me uma carta. Eu decidi não abrir na hora, primeiro pois meu coração palpitou, segundo porque meu pai não era de abrir uma comunicação dessa forma. Geralmente ele se comunicava conosco através da nossa mãe que sempre achou que ela deveria supervisionar todo e qualquer diálogo entre meu pai e nós. Só que dessa vez ele me enviou uma carta cujo o conteúdo eu não fazia a mínima ideia de qual fosse e confesso que estava com medo de ver.

Decidi caminhar até o campo de quadribol com a carta na mão. Eu poderia simplesmente abrir e ver o que era já que estava morrendo de curiosidade, porém eu tinha sempre a necessidade de ter alguém do lado para compartilhar o que quer que fosse, e no momento eu só conseguia pensar na minha gêmea. Mavis deveria estar fazendo o que eu não fazia, que era frequentar aulas, portanto eu ainda esperaria muito até que ela estivesse disponível. Eu não sei se aguentaria esperar por tanto tempo. Devido a isso, assim que cheguei no campo de quadribol eu acabei rasgando o envelope, colocando a carta diante do meu rosto, lendo-a enquanto caminhava pelo campo tanto para me distrair da leitura, quanto para aquietar minha ansiedade. — Querido filho, se você está lendo essa carta, saiba que ela foi escrita há anos atrás, bem quando te conheci e soube que, assim como os homens da família Ornellas, você seria diferente dos demais meninos. — Iniciei minha leitura em voz baixa enquanto caminhava pelo campo. Não fazia a mínima ideia do que ele poderia estar se referindo, pois não conhecia muito bem a parte da família vinda do papai, e mamãe fazia questão de que assim fosse, como se a família dele pudesse ser pior do que a parte dela, tsc... — Espero que não me compreenda mal e entenda que tive que aguardar até que você tivesse uma idade ok para compreender tudo, até porque sua mãe praticamente me obrigou a dizer isso somente quando você atingisse a maioridade... — Aquilo estava realmente me deixando preocupado. O que seria tão sigiloso que eu só pudesse vir a descobrir quando atingisse certa idade? Conheci meu pai quando tinha seis anos, por que esperar dez anos para contar algo? Tentei, meio atordoado, continuar a leitura de onde havia parado quando, de repente, tropecei em algo. Fui ao chão soltando um xingamento em alto e bom tom até perceber que não havia tropeçado num objeto, e sim numa pessoa. Continuei estirado no chão olhando para a garota que parecia não compreender de onde havia surgido o peso que praticamente a esmagou, já que ela era baixinha, e ergui ambas as sobrancelhas fazendo uma cara blasé. — O que a bonitinha tá fazendo sentada aí no chão? Puta que pariu, hein. Só dá maluco nesse castelo! — Sentei na grama, peguei minha carta que havia escapado da minha mão com o tombo, a dobrei e guardei no bolso da calça enquanto tentava limpar a grama que havia sujado meu uniforme. Decidi ler a carta depois, talvez aquele fosse até um sinal. Observando a garota a qual eu havia passado por cima, pude notar que ela não parecia estar bolada com a situação, o que me admira, pois se fosse comigo eu já estaria voando em cima da pessoa. Como fui eu o causador disso tudo, resolvi apenas fechar a cara e xingar, pois apesar de estar errado por não observar o caminho o qual eu ando, ela não estava totalmente certa sentada aí no meio do caminho. O campo é enorme? É, mas e daí? Eu quero que ela tenha certa parcela de culpa para não me sentir totalmente um lesado por tropeçar em alguém no meio de um campo tão grande.

And it's the thousandth time and it's even bolder, don't be surprised when you get bent over, they told you, but you were dying for it