História da magia era uma das matérias mais difíceis para Lorena, mas ela estava sempre disposta a dar outra oportunidade. Talvez com mais atenção, com mais disposição ela conseguisse aprender sem precisar se esforçar tanto. Assim que chegara na sala de aula, no entanto, o professor fora logo pedindo para que retirassem os sapatos e deixassem as coisas em um canto. A sala parecia maior do que ela se lembrava, e o chão estava protegido por um tapete peludinho que dava cócegas nos pés ao caminhar. Escolheu um canto para deitar-se que fosse próximo aos seus amigos e não pôde deixar de dar uma espiadinha em Arón antes de fechar seus olhos e aguardar o que havia sido preparado.

Todos estavam em silêncio quando começara a acontecer. Lorena estava em frente a um rio. Não fazia ideia de como havia parar ali. Viu de longe uma figura, um jovem índio. Se aproximou do homem que nem a torara, era como estar dentro da penseira, vendo, mas sem de fato interagir. Ouviu outra pessoa da tribo chamá-lo de Pirarucu. Ela lembrava de já ter ouvido sobre isso em algum lugar, mas preferiu vivenciar tudo como se nada soubesse do assunto. Ele era musculoso e dava para ver que tinha certa influência na tribo, mas era muito maldoso. A cena mudou um pouco e eu estava diante de duas entidades, dois deuses conversando sobre um castigo.

De volta para perto do rio, viu quando os raios começaram a iluminar a aldeia, quando as trovoadas ecoaram fortes e os índios começaram a procurar abrigo, Lorena também teria feito, mas não sentia a chuva em sua pele. Ela estava, de fato, sendo mera expectadora. Viu de longe o guerreiro que vira antes, dessa vez tentando fugir da chuva e de tempestade, mas não conseguiu sequer se manter em pé. Um raio tão forte quanto um chupa-cabra rompeu uma árvore muito grande, e enquanto Lorena gritava e tentava correr na direção do homem caído, mas fora tarde demais. A árvore caiu sobre a cabeça dele, que se achatou. Quanto mais perto chegava, mais perto via o sangue e os pedaços do corpo sendo empurrados pela enxurrada. Um dos deuses que ela vira antes parecia não satisfeito o suficiente, e transformou os restos que iam adentrando o rio em um peixe de grandes escamas e de cabeça chata. O nome do peixe levou o do guerreiro: e assim nascia o Pirarucu, cujas escamas compunham o núcleo da varinha de Lorena e fora o motivo pelo qual ela havia pesquisado sobre esse conto em específico.

Quando tudo ficara claro e ela vira o pequeno peixe no rio, os olhos de Lorena pesaram e se fecharam mesmo que ela não quisesse. Quando os abriu novamente, o professor Rodrigo estava diante dela com um olhar curioso. Enquanto ela estava tentando se situar no que acontecera, o professor perguntou como fora a experiência. — Eu estive lá com o Pirarucu quando ele ainda era um guerreiro. Eu vi os deuses ensaiando a morte dele, vi quando sua cabeça fora esmagada e seus pedaços viraram um peixe escamoso. Exatamente o mesmo que utilizaram as escamas para fazer o núcleo da minha varinha. Foi intenso, embora eu não conseguisse interferir ou sentir sequer a chuva. — Coçou os olhos, tentando despertar de vez, e depois de ouvir do professor que já podia ir embora, vira seus amigos ainda dormindo ou em transe, o que quer que fosse aquilo. Calçou os sapatos e pegou suas coisas, e vendo o professor acordar outro aluno, deixou a sala.