Rodrigo rolou a moeda de um real na mão, passando-a entre os dedos. Ao contrário dos bancos trouxas que já haviam se modernizado, resolvendo transações simples ao mero toque no telefone, o seu banco (e o da maioria dos bruxos) insistia em requisitar sua presença para qualquer procedimento. Naquela tarde, um procedimento específico fazia surgir um vinco entre as sobrancelhas do docente. — Sim, Gilberto. — Concordou, espalmando a mão, ainda que sem agressividade, na mesa e pressionando a moeda contra a madeira. — Sim, eu consigo entender. — Repetiu, soltando um gemido cansado para o gerente. — Não, mas... Sim, eu só preciso que libere o segundo cartão para a utilização em área trouxa. Não é difícil, Gilberto, antes de vir esse novo 'tava assim. — Acrescentou, juntando as mãos para esfregar o rosto e a breve pausa foi o suficiente para o banqueiro tentar se esquivar. — A gente vai passar do horário se preciso for, eu não pago anuidade pra ter que vir amanhã fazer a mesma coisa. É o meu dinheiro eu quero gastar e se é em meio bruxo, meio trouxa, tanto faz.

Os músculos de suas costas doíam contra a cadeira almofadada. Esticado em um ângulo estranho a bons vinte minutos, elas claramente haviam sido desenvolvidas para não suportar um adulto ali por mais de cinco minutos, mas após passar por todo o procedimento de espera e agora o atendimento inútil. — Mas barbaridade, Gilberto! — Gemeu o gaúcho, apoiando a mão na mesa de novo, cogitando nos confins de sua mente se abandonasse a pose solidária talvez alguma coisa adiantasse. — Me libera o teu sistema que eu ajusto isso, posso te apostar que deve ser preencher uns dois formulários, uns carimbinhos e ¡listo!

— Eu me senti tão bem atendido quando eu vim aqui na semana passada pra pegar os documentos pra Escola. — Acrescentou, amargurado, enquanto o gerente persistia em suas desculpas e esperanças vãs que, caso Rodrigo voltasse no dia seguinte, tudo seria fácil de resolver. — É sério, sentei, conversei contigo e tudo resolvido. Por que tu fica me atravancando o caminho assim hoje? É literalmente o melhor negócio que pode ter pra vocês. Se eu pagar, ótimo, se eu não pagar, melhor ainda que vocês me afogam em juros. — Comentou o professor, cruzando os braços enquanto se levantava. Não era exatamente dar-se por vencido, mas sim postergar a dor de cabeça. O sol em áries sendo ofuscado pelo marte em touro. — Eu volto amanhã e, agora que tu me lembrou disso, pode se preparar que a gente vai ter que conversar sobre essa história de 14% ao mês de juros. Tá achando que eu sou o que, porra? Sou professor!

Encolheu os ombros, ignorando as efusivas desculpas do funcionário, desejou-o um bom final de tarde e, justamente quando ia abrindo a porta da sala individual de Gilberto, deparou-se com a mais familiar de todas as vozes. Risonha, aguda e cheia do sotaque cantado porto alegrense, ninguém mais, ninguém menos que Maria Elisa ou, para ele e Raíssa, Mama Kaefer.

Em menos de um segundo, Rodrigo escondeu a face derrotada esbanjando o confortável sorriso desleixado que o livrara de muitas enrascadas da infância e abriu os braços. Se existisse qualquer oportunidade de fugir, teria aceitado, mas, de frente um ao outro, não adiantaria de nada fingir que não havia reconhecido a mãe. Inclusive apenas pioraria as coisas. — Mama! — Cumprimentou, fechando os braços ao redor da mulher que aninhou-se em seu peito. — Que que é que tu tá fazendo aqui?