Uma manhã de sábado livre de aulas e após uma semana de provas e trabalhos parecia a luz no fim do túnel para qualquer aluno, especialmente para Lorena que agora além de estagiária, estava se preparando fisicamente para os jogos representando os anacondas. Quando todas as meninas acordaram no alojamento fazendo a barulheira tradicional de todas as manhãs, a morena dispensou o café da manhã para ficar dormindo mais um pouco. Mesmo quando a tenda voltou a ficar silenciosa, algo dentro dela fazia tanto barulho que ela acabou não conseguindo voltar a dormir. Estava deitada em sua cama encarando o teto quando viu um vulto, o que a fez saltar na cama e tatear o colchão. Soltou o ar que nem percebeu estar segurando ao perceber que era somente um patrono, e para sua completa paz não era um flamingo. A voz saindo dele também não era de Beatriz, o que a fez jogar o tronco de volta para a cama. Estava tudo bem, não haviam descoberto nada, não havia nada contra ela. Apesar disso, não era exatamente uma mensagem que transmitia calma: Bianca dizia para encontrá-la na entrada da floresta perto da enfermaria. O que quer que fosse, unir a professora a uma enfermaria ou a uma floresta não era exatamente uma coisa tranquilizante. Novamente saltou na cama, dessa vez correndo para longe dela para escovas os dentes enquanto vestia o uniforme de aulas práticas. Pegou a capa de chuva, colocou a varinha no coturno e enquanto descia pelos galhos de Ybirá ia amarrando o cabelo. Uma manhã livre, com uma garoa fina que indicava que em breve cessaria, e no lugar de estar dormindo estava indo trabalhar. Que animador! Ao menos sabia que, se tratando de Torres, jamais seria chamada para algo entediante.

Apressou o passo enquanto vestia a capa de chuva, seguindo o patrono que nadava muito rápido, talvez um aviso de que Bianca estava impaciente. Conforme se aproximava da entrada da floresta podia ver os fios loiros o já tão conhecido jeito de caminhar da docente, caminhando até se encontrarem. Não havia ferimento aparente e ela estava muito bem, obrigada, então a enfermaria realmente era só um indicativo para a aluna se localizar de forma correta. Só restava uma aventura pela floresta, mas Lora não sabia se isso a deixava animada ou preocupada. — Bom dia, professora. — Disse de forma gentil, sorrindo sem mostrar os dentes em seguida. Estava tentando ser simpática. Talvez fosse uma coisa idiota de se fazer, já que a mais velha apenas disse que sabia que ela viria e que precisaria de ajuda. "Que grande começo de sábado", pensou a garota enquanto via a chefe assoviar. Foram poucos segundos entre o barulho emitido pela loira e o estremecer da fauna, e mesmo acostumada com a presença dos Lobos da Meia Noite, que inclusive ela estava ansiosa para ver na próxima semana, levou um breve susto. A criatura era bastante agradável, mas seu tamanho e a rapidez com que chegara não foram imediatamente amigáveis. Tentando disfarçar o pequeno abalo, Lorena que "precisavam ir". Jura? Bianca não disse mais nada, montando no animal pronta para partir. As duas mãos da garota foram de encontro a sua cintura numa pose de quem diz "sério, mulher, você não tem mais nada pra me contar? Talvez pra onde esse belo lobo vai nos levar, por exemplo?", mas optou por apenas seguir a docente para onde quer que ela quisesse ir. Se ela precisava de ajuda, quem era Lorena para questionar a respeito? Subiu no lobo com o máximo de cuidado que poderia expressar e então segurou-se em Bianca, ignorando completamente o pensamento de que deveria evitar tocar na mesma. Se o animal chegara tão rápido até elas, quem garantiria que ela daria conta de se segurar, ainda mais com os músculos do braço suficientemente cansados pelos treinos? O lobo logo começou sua trajetória para onde quer que estivessem indo.

INFORMAÇÕES:

Sem uma carroça para guiar e o cuidado de não andar em uma velocidade perigosa para os alunos, o animal corria tão rápido quanto Lorena imaginou, o que a fez se agarrar ainda mais em Bianca para garantir que não cairia da garupa. O vento e a chuva contra seu rosto atrapalhavam qualquer tentativa de adivinhar para onde estavam indo, e em um certo ponto ela apenas desistiu, fechando os olhos e forçando as pernas na barriga do animal para ajudar a se manter sentada quando este pulava. Durante o percurso e entre os sons de galhos e das patas batendo na lama e nos gravetos, ouviu a voz da professora falando sobre o que se tratava aquele passeio. Estavam indo de encontro as mães d'Oro que estavam sendo atacadas mais uma vez naquele mês. A Bedoya não sabia nem de um primeiro ataque, quem dirá que já se encaminhavam para o terceiro. — Quem? Quem está as atacando? — Perguntou o mais alto que pôde, mas se a loira tinha ouvido, preferiu ignorar a pergunta. "Mães d'Oro, certo... o que lembro sobre elas?", se questionou, usando todo o restante da trajetória até a aldeia para lembrar do máximo de detalhes possíveis para que pudesse ajudar de forma realmente útil.

Depois de um solavanco que quase a desequilibrou, a morena lembrou que sobre ataque as criaturas em questão sofriam uma espécie de descarga de adrenalina que ampliava a intensidade e o tamanho das chamas que recobrem seu corpo. Se isso estivesse acontecendo, o ideal seria evitar encarar seus corpos ou poderia causar lesões como se estivesse encarando o próprio sol. Lorena gostava da ideia por se sentir conectada ao elemental, mas seus cones e bastonetes eram os mesmos que de qualquer outro ser humano normal, então teria de se atentar a isso. Abriu os olhos novamente ao ouvir a voz de Bianca, mas dessa vez estava muito mais fácil de enxergar. O corpo da aluna começava a denunciar que a capa de chuva e o uniforme não estavam dando conta de manter sua temperatura corporal, mas não era um frio normal de quem se molhou na chuva. Aquela sensação era muito mais preocupante do que somente uma mudança de temperatura, e ela lembrava de já ter sentido aquele frio antes. Os galhos mortos e a falta de vida pelo restante do trajeto serviram para confirmar o que as estranhas de Lora já avisavam: estavam indo de encontro aos chupa-cabras.

No início de junho o trio Hermione havia enfrentado pessoalmente aqueles não-seres, e na ocasião o sol fora usado para intensificar o feitiço de luz solar lançado contra os chupa-cabras. Além do patrono, eles odiavam exatamente o que o corpo das mães d'Oro representavam em uma situação de ataque, então por que elas não estavam conseguindo expulsar os não-seres de seu território? Como um recado, uma gota de chuva caiu na ponta do nariz de Lorena antes de chegarem. Certo, a chuva. Se só a umidade já dava trabalho para as belas criaturas, a chuva deveria ser a consolidação da dificuldade de contra-atacar. Tendo isso em mente, quanto o Lobo encerrou o trajeto até a aldeia, a garota desceu dele em um pulo, aproveitando para tirar a capa de chuva que agora grudava em seu corpo. A deixou em um lugar onde lembraria de pegá-la de volta na hora que a tarefa tivesse acabada e puxou a varinha de dentro dos coturnos, a girando nos dedos antes de empunhá-la da forma correta.

As duas caminharam juntas até o centro da aldeia, onde uma luta desigual já havia deixado duas feridas. Dois corpos dourados e de deixar com inveja qualquer bruxo que sonhava com um corpo esculpido estavam caídos no chão, mas não havia tempo para tentar reanimá-los, pois seis chupa-cabras atacavam o resto da aldeia. Bianca havia tomado a frente e conjurado mais uma vez o seu patrono, que agora nadava como um reforço para as criaturas. Lorena se posicionou e usou suas táticas de meditação para focar somente em sua melhor memória, ignorando o frio e a adrenalina. Foi assim que ela apontou a varinha para frente. — Expecto Patronum! — Lançou ela, tentando manter a memória feliz presente.

INFORMAÇÕES:

O patrono saiu da varinha da Bedoya com uma força tão grande que quando a professora pediu ajuda e desfez o próprio patrono para lançar um feitiço para mudar o efeito do tempo. Embora não tivesse olhado para cima para averiguar que estava funcionando, era possível notar uma melhora na aparência das mães d'Oro ao mesmo tempo que o frio parecia menos agressivo. A varinha de Lorena se movia conforme ela guiava seu cavalo gipsy em direção aos chupa-cabras, tentando os manter o mais afastados das criaturas quanto fosse possível. A pelugem do patrono brilhava tanto que parecia uma bela imagem de paz espantando a representação de morte. — A Malvina tinha razão. — Disse baixinho.

Se sentiu renovada ao sentir o calor do sol em sua pele, e por um breve momento sentiu paz. Seu elemental havia sido trazido de volta graças ao feitiço de Bianca, e não somente Lorena se sentia mais forte como as criaturas também aparentavam estar se recuperando. Seus dourados davam espaço as chamas e o brilho de seus corpos ensolarados pareceram segurar o distanciamento das criaturas quando o patrono da sextanista foi enfraquecendo até sumir definitivamente. Nesse momento ela apontou a varinha para as mães d'Oro caídas, tentando renovar suas energias. — Incendio! — Lançou na tentativa de acordar as duas.

Enquanto Lorena tentava cuidar das criaturas feridas, as que estavam bem de saúde e agora possuíam o sol a seu favor deram uma boa surra de luz nos não-seres, que foram se distanciando até não ser mais possível vê-los ou sequer sentir a sua presença. Se aquele havia sido o terceiro ataque no mês, era provável que aquelas criaturas horrendas fossem voltar, mas não agora, não com os corpos brilhantes e as chamas que não queimavam a vegetação, mas que causavam um leve desconforto nos olhos. A aluna virou-se para a mestra, aparentando preocupação. — E se eles voltarem? Céus, eu nem lembrava que os chupa-cabras ainda estavam aqui. Bem que a Mogli avisou. — Disse ela, realmente temerosa de um possível retorno. O que elas poderiam fazer pelas criaturas até ali, haviam feito. Agora era hora de voltarem a escola, encerrando mais um dia de vivências ofertadas pelo estágio.

INFORMAÇÕES: